No capítulo
anterior, com a ajuda de um segurança, Zuleica consegue encontrar seu carro no
estacionamento do hospital. Somente se lembra que a filha está esperando no
colégio, quando vê no visor do celular várias ligações da garota. Enquanto isso
Letícia e Carlinhos chegam em casa e ficam sabendo pela vizinha que sua mãe
sofreu um acidente. Letícia se desespera e desobedece a ordem do pai de ficar
com o irmão Carlinhos na casa da vizinha. A adolescente deixa Carlinhos com a
vizinha e corre até o ponto de ônibus. Segue em direção ao hospital.
CENA 1 – HOSPITAL E
MATERNIDADE LUZ/ SALA DA RECEPÇÃO – INT./DIA
Zuleica volta do estacionamento. Está atordoada.
Conversa com Sandro, enquanto observa Ronaldo que senta e se levanta várias
vezes.
SANDRO
Então, amor,
encontrou o celular?
ZULEICA
Sim. Estava mesmo no carro. E você
não sabe da maior...
SANDRO
Algum problema lá
no estacionamento?
ZULEICA
Não. O problema são
as ligações perdidas que estão aqui.
SANDRO
Ah, não. Não me
diga que...
ZULEICA
Esqueci
completamente da Valquíria. Deve estar uma fera faminta em frente ao portão da
escola.
SANDRO
(Com agitação) Querida, que loucura! Vou agora mesmo
buscar a garota.
ZULEICA
Vai, mas volta
logo, querido. Não vou suportar ficar aqui sozinha.
SANDRO
Fique tranquila,
amor. Vou num pé e volto no outro. (sai apressado)
CENA 2 – PORTÃO DO
COLÉGIO/BLOCO B – EXT./DIA
Valquíria se cansa de esperar. Resolve ir andando.
Ajeita a mochila em um dos ombros, pendurando-a por uma das alças. Enquanto
caminha na calçada, um estranho carro preto, muito próximo ao meio fio
acompanha lentamente os passos da garota. Ela corre. O carro aumenta a
velocidade. Ela pára. Súbito abre-se a porta do carro e um homem forte a
agarra, tampando-lhe a boca. Esperneando, derruba a mochila, enquanto é
arrastada. Ela é colocada à força pela porta de trás do carro. O homem forte,
trajando um terno preto, bate uma mão na outra como se estivesse limpando-as ao
mesmo tempo em que olha para os lados. Entra em seguida no carro, que sai
cantando pneu em disparada.
CENA 3 – CASA DE
DONA VÂNIA/ SALA DE ESTAR – INT./DIA
Dona Vânia pede a Carlinhos para sentar-se a mesa com a
neta de quem toma conta. A menininha tem 10 anos e está fazendo a tarefa
escolar. Carlinhos está cabisbaixo. Não olha para Débora. Fica calado, sentado
no sofá, tristonho, enquanto lágrimas saem de seus olhos.
VANIA
Oh, meu filho. Não
fique assim não. Você vai ver como logo, logo sua mãe está de volta.
DÉBORA
Carlinhos, não me
conhece mais não?
CARLINHOS
Me deixa!
VANIA
Tá bom, Carlinhos,
fique aí. Vou ligar a televisão e estourar pipoca pra você.
DÉBORA
Oba, também quero.
Posso para com a tarefa para assistir televisão com o Carlinhos, vó?
VANIA
Claro, Débora.
Depois você continua. Carlinhos está mesmo precisando de companhia.
Débora senta-se perto de Carlinhos sem falar nada. O
menino sai correndo, chorando em direção aos fundos da casa. Encontra um
pezinho de limão e é embaixo dele que fica recolhido. Dona Vania olha e vê o
garoto lá. Aconselha a neta.
VANIA
Você deve estar
achando estranho o comportamento de Carlinhos, não é Débora?
DÉBORA
Sim, vovó! Ele
sempre foi legal comigo. Brincamos juntos quase todos os dias.
VANIA
Pois é, querida, mas hoje ele não está com
cabeça para brincar. Só pensar na mãe que sofreu um acidente e está no
hospital.
DÉBORA
Que triste, né, vó? Vou rezar pra mamãe
dele ficar boa.
VANIA
Também farei isso, querida! Agora é
melhor deixar Carlinhos sozinho com seus pensamentos.
CENA 4 – PORTÃO DO
COLÉGIO/BLOCO B – EXT./DIA
Sandro estaciona o carro bem em frente ao portão do
colégio. Desce do carro, olhando de um lado para o outro. Encosta-se no carro e
espera um pouco, sempre olhando no relógio. Desesperado, empurra o portão. Dá
de cara com o diretor que preparava-se para sair.
ANSELMO
Senhor Sandro, que
faz por aqui?
SANDRO
Vim pegar minha
filha com um pouco de atraso.
ANSELMO
Com um pouco de
atraso? Ela já saiu faz uma hora.
SANDRO
Ué, para onde ela
foi então?
ANSELMO
Desculpa, senhor,
mas essa resposta eu não posso lhe dar.
SANDRO
Mas ela deveria
estar esperando aqui...
ANSELMO
Convenhamos, senhor Sandro. Acha que uma
adolescente consegue ficar esperando alguma coisa por uma hora?
SANDRO
O senhor tem razão.
Uma hora é muito tempo. Bom, acho que ela foi para casa a pé mesmo.
ANSELMO
Não poderia ter ido
de ônibus ou de táxi?
SANDRO
É. Vou dar uma
ligadinha lá em casa.
ANSELMO
(Com humor) E eu vou almoçar,
que meu estômago já está grudado nas costas, como dizem os jovens.
SANDRO
Bom apetite, senhor
Anselmo e obrigado.
ANSELMO
Não há de que!
Passar bem, senhor Sandro. Estimo que sua filha esteja bem em casa. (Sai)
Sandro liga para
casa. Tenta várias vezes. Só chama. Ninguém atende.
SANDRO
Onde se meteu essa menina, diacho? (Caminha de um lado a outro) Justo hoje
ela foi sumir! Peraí! Ela deve estar do lado de fora da casa. É isso! A
Valquíria não tem a cópia da chave. Como pude ser burro! É lógico que ela já
chegou a casa, mas como não tem a chave está esperando no quintal. Filhos,
filhos!
Sandro
dá volta passando atrás do carro. Abre a porta e entra rapidamente. Sai correndo
feito um louco.
CENA
5 – HOSPITAL E MATERNIDADE LUZ/RECEPÇÃO – INT./DIA
Ronaldo se cansa de andar de um lado para o outro.
Senta-se próximo a Zuleica. Ela fica espantada. Ronaldo puxa conversa.
RONALDO
Boa tarde! A
senhora está com alguém da família internado aqui?
ZULEICA
(Nervosa, gaguejando) Não, parente não. Uma amiga.
RONALDO
Ah, claro! Deve ser
muito querida essa amiga, né. A senhora já tava aqui quando eu cheguei.
ZULEICA
(Ainda nervosa) É sim, grande amiga.
RONALDO
Vou te contar um
segredo: não gosto deste lugar.
ZULEICA
De hospital? Também
tenho pavor.
RONALDO
Não. Eu to falando
que não gosto deste hospital.
ZULEICA
Eu não gosto de
nenhum, mas pra falar a verdade, este daqui é o que me dá mais pavor.
RONALDO
Deve ser por causa
do incêndio não é mesmo? A senhora lembra?
ZULEICA
Sim, eu estava
internada aqui.
RONALDO
Um dia antes do
incêndio, minha mulher deu à luz um menininha.
ZULEICA
Que coincidência!
Eu também dei à luz uma menininha no mesmo dia.
RONALDO
Sério? Então a
senhora passou todo aquele horror.
ZULEICA
Sim. Mas graças a
Deus os bombeiros conseguiram tirar a todos com vida.
RONALDO
Sim. Já faz 14
anos. É a idade da minha filha. Minha mulher e eu demos o nome de Letícia para
ela.
ZULEICA
Bonito nome.
Letícia quer dizer alegria.
RONALDO
Sim. A gente sabia. Foi a maior alegria pra
gente quando os bombeiros saíram com as crianças no colo.
ZULEICA
E uma delas era
minha filha Valquíria.
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